top of page
  • Rogger da Costa

De gandula do pai a saltos no asfalto, a história do Goleiro Everson

Atualizado: 15 de mai. de 2020

Foto: Flickr Santos 

Paixão nacional, o futebol do Brasil começa na rua ou na terra. Tirar “a tampa do dedão” ao chutar o asfalto é quase um ritual para toda criança nascida no país. Descalços, os pés das crianças brasileiras apaixonadas pelo esporte encontram mais o pavimento do que o chinelo – que serve apenas para delimitar o tamanho do gol: dois passos. Não com ele. Quando Everson estava na rua, era o joelho que se chocava com o asfalto dentro de um “golzinho” de chinelo com o triplo do tamanho.

O camisa 22 do Santos gosta de marcar gols, sim, ele já bateu faltas e pênaltis na carreira. Mas se engana quem pensa que em algum momento da vida de Everson, ele pensou em jogar na linha. Inspirado pelo pai, goleiro na várzea, Everson era o gandula do seu Paulo Pires nos jogos e já dava suas pontes no intervalo das partidas do pai.

“Goleiro é uma profissão ingrata desde sempre. Todo mundo erra, somos falhos, mas o problema do goleiro é que 90% das vezes que você erra, você leva o gol. Mas foi a paixão que eu sempre tive desde criança. Nunca quis jogar na linha, apesar de gostar de fazer gol, fazer goleiro-linha no salão, bater faltas… Via meu pai jogar no gol e me espelhava muito nele, ele sempre foi meu ídolo. Sempre quando brincava na rua, eu falava: ‘a gente pode fazer gol no gol pequeno, mas o meu é grande e eu vou ser o goleiro’. O golzinho de dois passos virava de seis e eu não tinha medo de me jogar no chão no meio do asfalto: ralava o cotovelo, joelho… Eu nasci goleiro”, disse Everson, em entrevista exclusiva ao UOL ESPORTE.

O caminho do goleiro santista foi longo. Natural de Pindamonhangaba, interior de São Paulo, Everson fez as categorias de base no São Paulo, onde via Rogério Ceni brilhar no time profissional. De lá, ele foi para o Guaratinguetá-SP, mas ficou quatro anos na reserva de Jailson, hoje no Palmeiras. Lá ele conviveu com o técnico Sérgio Guedes, ex-goleiro do Santos, por quem Everson nutre admiração e Evair, ídolo do Palmeiras, que era auxiliar técnico e proporcionou o verdadeiro início para o arqueiro.

A primeira oportunidade veio longe de casa: o River-PI. Evair, que estava começando a carreira como técnico, convidou Everson para ser seu titular na equipe do Piauí. O contrato assinado foi de quatro meses e foi suficiente para ser campeão estadual e chamar atenção do Confiança-SE.

No Piauí, apesar da boa fase dentro de campo, Everson passou as maiores dificuldades da carreira fora dele. Morando de aluguel e com salário baixo, o goleiro que já era pai de dois filhos e tinha ajuda dos familiares de sua esposa para viver. O dinheiro só dava para pagar escola para um dos filhos.

“No River-PI, que é importante na minha carreira, mas foi onde mais sofri. Tive bastante ajuda dos familiares meus e da minha esposa, até para pagar escola do meu filho – não tinha condições de colocar os dois, então só o mais velho ia. Ela [filha mais nova] já poderia ir para a escola, mas a gente optou por não colocar por receber pouco. Tinha ajuda da minha sogra, mas tinha aluguel, parcela do carro, convênio… Não tinha como. Quando fui para o Confiança consegui colocar os dois, tinha um conselheiro que era dono de uma escola e ele deu bolsa, mas, mesmo assim, eu atrasava a mensalidade porque o clube não pagava em dia. Explicava para ele, e ele entendia”, contou.

No Confiança-SE, Everson jogava por mais um mês de salário. A equipe disputava a Série D do Brasileiro e, para continuar recebendo, o time precisava ir avançando de fase. Degrau por degrau, Everson e o Confiança conquistaram o acesso à Série C de forma invicta e, em uma entrevista coletiva emocionada, o goleiro se despediu do time de Sergipe rumo ao Ceará.

Me orgulho muito dessa história. Jogar uma Série D, uma Série C e uma Série B pra depois jogar a Série A não são todos que conseguem passar por cada etapa. Com trabalho você pode chegar a lugares inimagináveis.

“Tenho muito carinho pelo Confiança-SE e pelo povo sergipano. Sempre fui muito bem recebido por todos, até pelos rivais, andando na praia, no shopping… Eu penso em ter o último jogo da minha carreira no Confiança. Muitos podem achar que é pouco, posso ter uma carreira pela frente ainda. Mas desejo jogar a despedida lá. Espero que a diretoria da época queira. Se hoje eu estou aqui, foi por que eles abriram as portas. Seria muito especial para eu me despedir do futebol lá”, afirmou.

Foi no Ceará que Everson se mostrou para todo o Brasil. Após a Série B, o goleiro jogou a Série A e despertou interesse de alguns clubes, entre eles o Santos. A proposta do Peixe paralisou o goleiro e fez a ansiedade tomar conta do sereno Everson.

“Quando ele [empresário] mandou a imagem da proposta e eu vi o símbolo do Santos, eu paralisei. A negociação se arrastou mais de duas semanas. Lembro que o Edinho [ex-Internacional] me falou: ‘quando arrasta assim é porque vai dar certo, sei que você quer muito ir e está ansioso, mas fica tranquilo’. Eu fiquei calmo… por uns 20 minutos (risos). Quando saiu na televisão, meu filho viu e falou: “que bom, pai, lá tem praia”, contou Everson, que confessou que sempre quis jogar em um clube de cidade praiana.

“O Santos é um dos maiores clubes do mundo, sem demagogia nenhuma. Não é porque hoje visto essa camisa. Eu lembro que minha estreia na Série A foi contra o Santos e eu fiquei muito empolgado pela situação”

No Peixe, Everson chegou de mansinho, apesar de ter sido indicado pelo ex-técnico Jorge Sampaoli. Com pouco tempo no clube, o goleiro ganhou a posição do ídolo Vanderlei. O voto final de confiança veio no início deste ano, quando o Peixe vendeu o ex-camisa 1 ao Grêmio. Everson, no entanto, não quis o número do habitual titular do gol e optou por manter a camisa 22.

“No Ceará não tinha numeração fixa. Na Série B a rotatividade é diferente da A, muito grande. Quando tive a oportunidade de ter número fixo lá, lembrei da minha base no São Paulo e lembrei do Rogério [Ceni] também, escolhei a 01. Queria usar um número diferente. Quando cheguei ao Santos a 1 estava com o Vanderlei. Meu aniversário é dia 22 e, por incrível que pareça, todas as casas que morei tinha o número 2, reparei nisso depois que escolhi o 22. Vagou a número 1, mas como fiz uma boa temporada com a 22, preferi manter”, explicou.

Depois de abrir mão de quase R$ 2 milhões para se transferir para o Santos, referente aos 25% que detinha de seus direitos econômicos, Everson já se tornou um dos principais jogadores do Santos. Na temporada 2020, o goleiro que quer atuar até os 40 anos é um dos maiores destaques da equipe santista.

7 visualizações0 comentário
bottom of page